Massacre sionista de Kafer Qassem
No dia 29 de outubro de 1956 foi iniciada a retaliação britânica e francesa, apoiada pelos israelitas, contra o regime progressista de Gamal Abdel Nasser, em represália à sua corajosa atitude de nacionalizar o Canal de Suez, e também pela honestidade do estadista egípcio em apoiar declaradamente a revolução argelina contra o indecente imperialismo francês.
No mesmo dia Israel, valendo-se da situação ainda confusa e da desorientada opinião publica internacional, perpetrou uma das mais terríveis e desumanas chacinas contra aquelas populações árabes que se recusavam a abandonar as suas terras e propriedades ancestrais. O alvo foi a cidade árabe de Kufur-Kassem, ao norte da Palestina.
Na manhã de 29 de outubro de 1956, o comandante militar da região central de Israel, general Tsfi-Sour, convocou o coronel Shedmi, comandante militar da área de fronteira com Jordânia, e o tenente Melinki, que comandava uma unidade militar naquela área. A reunião era para dar início à execução de um plano que o general Tsfi-sour tinha recebido da cúpula israelita sob a recomendação de "Top Secret". Ao final da reunião o tenente Melinki perguntou ao coronel Shedmi: "O que será das pessoas que estivem fora de casa após as 17:00 h?"... a resposta do coronel foi: "Que Deus os tenha."... O tenente insistiu: "E o que faremos com os feridos?"... A brutal resposta do coronel Shedmi foi: "Não haverá feridos."
A população árabe vivia sob toque de recolher das 22:00 h às 4:00 h, desde a criação do Estado de Israel, e o macabro plano "Top Secret" era para adiantar criminosamente o horário do toque de recolher em três horas (às 17.00 h., e não às 22:00 h.) com ordem de "atirar para matar" em qualquer árabe que estivesse na rua.
Às 16:30 h do mesmo dia, o tenente Melinki mandou avisar o prefeito de Kufur Kassem, enquanto orientava os seus oficiais para as novas disposições, detalhando toda a operação e avisando que só não seria preciso atirar em quem estivesse dentro da casa. O plano de Melinki era dividir a cidade em três eixos; cada eixo guardado por uma célula de um oficial e três soldados a leste e a oeste, e um eixo móvel. O oficial Dahan Gabrail com a sua célula ficou com o eixo oeste, e oficial Oufar Shaloom com o seu grupo estava no eixo leste. O oficial Oleil Gabreil e o tenente Melinki, ficaram no eixo móvel para apanhar qualquer árabe que pudesse escapar dos outros dois comandos.
Dentro de poucas horas, praticamente às 18:00 h, à hora do retorno dos trabalhadores que voltavam de suas propriedades rurais, ou de seus empregos em cidades vizinhas, o exército de "defesa" israelita já tinha abatido quarenta e sete trabalhadores e outros dezoito feridos gravemente.
A chacina foi encoberta até ao dia 6 de novembro. Uma semana depois, os jornais noticiaram que o governo israelita do ministro David Ben Gurion "estava estudando a criação de uma comissão para investigar os acontecimentos em Kufur-Kassem onde alguns árabes teriam morrido por desobediência ao toque de recolher na semana passada."
Frente às manobras do governo para ludibriar a opinião publica, dois deputados do partido comunista, Tawfiq Tibi e Meier Filner assinaram um manifesto e o encaminharam para centros jurídicos do país e para lideres comunitários pedindo para acompanharem o caso e acusaram o governo de racismo, bem como pediram a instituição de um comitê popular de investigações para levar o caso ao parlamento.
Latif Duri, um ativista do partido trabalhista MAPAM, conseguiu entrar escondido na cidade de Kufur-Kassem para coletar depoimentos da população e entregou esse material a Ouri Afneri, diretor de um jornal semanal que publicou toda a matéria sobre essa atrocidade israelita.
Imediatamente o primeiro ministro Ben Gurion foi ao parlamento e pediu para não se discutir o fato por motivos de "Máxima Segurança do País", pedindo desculpas pela chacina e falou sobre a criação de uma corte militar para julgar os responsáveis.
Em 15 de janeiro de 1957 foi instalada uma corte militar presidida pelo juiz Beniamin Halifi, na qual havia onze réus, e entre eles estavam o coronel Shedmi, o tenente Melinki, o tenente Dahan, o tenente Aufar Shaloom e outros. Em 16 de maio foram divulgadas as sentenças, sendo a maior de dezessete anos e a menor de alguns meses. Os réus recorreram e foi instaurada uma nova corte militar no dia 1º de fevereiro de 1959, esta presidida pelo juiz Moshe Landau que, depois de três meses de trabalho julgou as sentenças anteriores muito pesadas, mandou libertar os réus de menor sentença, e comutou as maiores para catorze anos. Poucos meses depois, Melink e os outros foram libertados sob perdão; ninguém cumpriu mais de três anos por esse crime abominável contra a humanidade.
O coronel Shedmi foi advertido por ordenar toque de recolher fora da sua jurisdição e multado simbolicamente em um centavo.
Para a população de Kufur-Kassem não restou muita coisa a fazer perante a brutalidade do racismo judeo-sionista. Recolheram donativos entre a população e fizeram um monumento com os nomes dos que tombaram vítimas do terrorismo de Estado judeu. Esse monumento está na entrada principal da cidade, perpetuando assim a memória de seus mártires.
Ataque em Qana remete a massacre de 1996
História de Qana tem passagens bíblicas e tragédias. A cidade libanesa de Qana, no sul do Líbano, é conhecida por dois episódios na história, e provavelmente, na manhã deste domingo, por um terceiro, depois de um ataque aéreo de Israel.De acordo com relatos bíblicos, acredita-se que Qana teria sido o cenário do primeiro milagre de Jesus Cristo, quando ele transformou água em vinho, durante um casamento na cidade de Cana da Galiléia.
Recentemente, Qana foi cenário de um dos mais sangrentos eventos do confronto árabe-israelense, quando forças israelenses bombardearam uma base da ONU, em 1996.
O choque da comunidade internacional com o acontecido – 100 mortos e outros tantos feridos – levou a uma forte pressão por um cessar-fogo para que Israel encerrasse uma ofensiva contra o Hezbollah, chamada Operação Vinhas da Ira.
O massacre de Qana, como o evento é conhecido no Líbano, permanece um poderoso símbolo para o povo libanês de quão indiscriminadas e desproporcionais são as atitudes de Israel em resposta às ações do Hezbollah.
“Não foi acidente”
Israel insiste que o bombardeio de 1996 foi um acidente e que o alvo era legítimo – uma unidade militar do Hezbollah que disparava mísseis e foguetes de uma área próxima à base.
Também naquela ocasião, Israel acusava o grupo libanês de usar civis como escudos ao fazer seus ataques.
Entretanto, uma investigação da ONU no mesmo ano revelou que era improvável que as mortes na base de Qana fossem resultado de um acidente.
O relatório da ONU disse que o ataque repetido à pequena base da entidade causou uma chuva de estilhaços, responsável por terríveis ferimentos em civis desprotegidos, e que helicópteros israelenses provavelmente testemunharam o banho de sangue.
Lugar estratégico
Na atual rodada de bombardeios israelenses, Qana voltou ao noticiário – cena de vários incidentes, como o ataque israelense a duas ambulâncias da Cruz Vermelha e a morte de uma jovem fotógrafo libanês, Layal Najib, também num ataque aéreo.
Não é difícil ver porque Qana está sempre perto das manchetes quando se olha no mapa.
A cidade fica na parte norte de um planalto no sul do Líbano que faz fronteira com Israel e também è a confluência de cinco estradas estratégicas para o sudeste libanês, ao sul de Tiro.
Qana e os pequenos vilarejos ao seu redor estão no meio de uma região com forte presença do Hezbollah, onde Israel afirma ser a origem de ataques do grupo.
Autoridades israelenses disseram que panfletos foram jogados na região para exortar os civis a deixar a área, possibilitando as operações anti-Hezbollah.
Contudo, parece claro, com grande o número de automóveis civis e carros bombardeados nas estradas em direção a Tiro, muitos moradores preferiram não atender os alertas feitos com os panfletos.
Massacre no Líbano
COMO PODEMOS PERMITIR QUE ISTO CONTINUE?
O governo Israelita recusa qualquer cessar-fogo e convocou mais 15 mil reservistas. O primeiro ministro israelita garante que vai bombardear pelo menos 15 dias. O horror e a indignação estão presentes neste texto do jornalista do The Independent Robert Fisk que vive no Líbano:
Escreveram, nas coberturas de plástico, os nomes das crianças mortas. "Mehdi Hashem, 7 anos, Qana”, escrito em caneta de feltro no saco onde repousava o corpo da criança. "Hussein al-Mohamed, 12 anos, Qana", "Abbas al-Shalhoub, 1 ano de idade, Qana.'' E quando o soldado libanês veio recolher o pequeno corpo de Abbas, este curvou-se no ombro do soldado, provavelmente como o fazia no ombro do seu pai.
No total, 56 corpos foram trazidos para o hospital governamental de Tiro e para outras enfermarias, dos quais 34 eram crianças. Quando se esgotaram os sacos plásticos, embrulharam os pequenos corpos das crianças em tapetes. Os seus cabelos estavam emaranhados em areia, muitos tinham sangue a correr pela face. É preciso ter-se um coração de pedra para não se sentir a indignação que alguns de nós sentiu ao assistirmos ao que aconteceu. Este massacre foi uma obscenidade, uma atrocidade, sim, se a força aérea israelita bombardeasse, de facto, alvos estratégicos como reclama, isto também seria um crime de guerra. Israel reclama que os mísseis foram disparados pelos guerrilheiros do Hezbollah do sul do Líbano, da cidade Qana, como se isto justificasse este massacre. O primeiro-ministro israelita, Ehud Olmert, falou sobre o “terror islâmico” que ameaça a civilização ocidental, como se o Hezbollah tivesse morto todas estas pobres pessoas.
Em Qana, apenas há 10 anos atrás, era o cenário de um outro massacre israelita de 106 refugiados libaneses mortos pela artilharia israelita, enquanto se abrigavam numa base das Nações Unidas da cidade. Mais de metade destas 106 pessoas eram crianças. Mais tarde, Israel disse que não tinha nenhum avião-espião de reconhecimento sobre o local do massacre, uma declaração que se verificou não ser verdadeira.
O Independent descobriu um vídeo que mostrava este avião por cima do Campo em chamas. É como se Qana, cujos habitantes afirmam ter sido a vila onde Jesus transformou a água em vinho, fosse amaldiçoada pelo Mundo, condenada para sempre a receber tragédias.
E não há dúvidas acerca dos mísseis que mataram todas estas crianças ontem. Vieram dos Estados Unidos, e num dos seus fragmentos estava escrito: “MK-84 Bomba Guiada BSU-37-B”. Sem dúvida que os fabricantes podem chamá-la de “à prova de combates”, porque destrói prédios de três andares, como aquele onde as famílias Shalhoub e Hashim viviam. Perderam a vida quando se refugiaram na cave para fugir de um enorme bombardeamento israelita.
Encontrei Nejwah Shalhoub deitada no hospital governamental de Tiro, a sua face e o seu maxilar tinham ligaduras, como Robespierre antes da sua execução. Ela não chorou, nem gritou, apesar da dor estar escrita na sua cara. O seu irmão Taisir, que tinha 46 anos, foi morto. Também a sua irmã Najla. Também a sua pequena sobrinha Zeinab, que tinha apenas 6 anos. “Estávamos na cave escondidos quando a bomba explodiu à uma da manhã”, disse ela, “Em nome de Deus, o que fizemos nós para merecer isto? Tantos dos mortos são crianças, os idosos, as mulheres. Algumas das crianças ainda estavam acordadas a brincar. Porque é que o mundo nos fez isto?”. Com as mortes de ontem, são cerca de 500 o número total de mortos civis no Líbano, desde o início dos bombardeamentos israelitas por ar, terra e água, a 12 de Julho de 2006 depois do Hezbollah ter cruzado a linha da fronteira, ter morto 3 soldados israelitas e capturado outros dois. Mas o massacre acabou com mais de um ano de antagonismo mútuo dentro do governo libanês onde políticos “pró-americanos” e “pró-sírios” denunciaram o que descreverem de “um crime horrendo”. Milhares de manifestantes atacaram o maior edifício das Nações Unidas, em Beirute, gritando: “Destrói Telavive, destrói Telavive,” e o primeiro-ministro do Líbano, o normalmente imperturbável Fouad Siniora, chamou a secretária de Estado Norte-americana Condoleezza Rice e ordenou que esta cancelasse a sua iminente vagem de paz a Beirute.Ninguém neste país poderá esquecer como o presidente George Bush, a Sra. Rice, e Tony Blair recusaram repetidamente pedir um cessar-fogo imediato, uma trégua que poderia ter salvo todas aquelas vidas. A Sra. Rice apenas disse:” nós queremos um cessar-fogo assim que possível,” um comentário seguido de um anúncio israelita de que tencionam manter os bombardeamentos no Líbano por mais duas semanas no mínimo. Durante o dia, os habitantes de Qana e a protecção civil escavaram as ruínas do edifício com pás e com as mãos, rasgando o entulho até conseguirem retirar um corpo atrás de outro, ainda vestidos com roupas coloridas. Numa das secções das ruínas, eles encontraram o que restava de um quarto com 18 corpos lá dentro. 12 dos mortos eram mulheres. Por todo o sul do Líbano agora, encontram-se cenas como esta, não tão grotescas em escala, talvez, mas também terríveis, para as pessoas destas vilas que estão aterrorizadas para sair e aterrorizadas em sair. Os israelitas deixaram cair panfletos em Qana, ordenando as pessoas a abandonar as suas casas. Até agora, por duas vezes, desde que Israel começou os ataques, os israelitas ordenaram os habitantes de vilas e aldeias a abandonarem as suas casas e depois atacaram-nos com aviões enquanto estes obedeciam às instruções israelitas e fugiam. Existem pelo menos 3000 muçulmanos Shia encurralados entre as vilas de Qlaya e Aiteroun perto das últimas incursões militares em Bint Jbeil e nenhum deles poderá sair sem medo de morrer nas estradas.
E qual foi a reacção do Sr. Olmert? Depois de expressar o seu “grande pesar”, ele anunciou: “nós não vamos parar este conflito, apesar dos difíceis incidentes desta manhã. Nós vamos continuar a actividade, e se necessário ela será estendida sem hesitação.” Mas quanto mais poderá ser estendida? A infraestrutura libanesa está a ser progressivamente destruída, as suas vilas aniquiladas, o seu povo cada vez mais aterrorizado e o terror é a palavra usada pelos bombardeiros israelitas feitos na América. Os mísseis do Hezbollah são feitos no Irão, e foi o Hezbollah que iniciou esta guerra com os seus raides ilegais e provocadores pela fronteira. Mas a selvajaria israelita contra a população civil tem chocado profundamente não apenas os diplomatas ocidentais que permanecem em Beirute, mas centenas de trabalhadores humanitários da cruz vermelha e de outras grandes agências humanitárias.
Incrivelmente, ontem Israel negou uma passagem segura à caravana do Programa Alimentar das Nações Unidas em rota para o Sul, uma missão de seis camiões que deveria transportar produtos de assistência para a cidade do sudeste de Marjayoun. Mais de 750 mil libaneses saíram de suas casas, mas não existe m número preciso dos que ficaram encurralados no sul. Khalil Shalhoub, que sobreviveu entre os destroços de Qana ontem, disse que a sua família e a família Hashim foram atacados por aviões durante mais de duas semanas. A autoestrada de mais de 7 milhas entre Qana e Tiro está desfeita com casas em ruínas e carros familiares incendiados. Na quinta-feira, o exército israelita na rádio Al-Mashriq, que difunde para o sul do Líbano, transmitiu aos residentes que as suas vilas iriam ser “totalmente destruídas” se fossem disparados mísseis. Mas se alguém observou os ataques de Israel nestas últimas duas semanas sabe que, em muitos casos, os israelitas não sabem o local exacto de onde o Hezbollah dispara os mísseis, e quando sabem, eles falham os seus alvos. Como poderá um habitante de uma vila ou aldeia prevenir o Hezbollah de disparar rockets da sua rua? O Hezbollah resguarda-se em casas civis, tal como as tropas israelitas ao entrar em Bint Jbeil na semana passada. Mas poderá ser isto uma desculpa para o massacre desta dimensão?
O Sr. Siniora dirigiu-se aos diplomatas estrangeiros em Beirute, ontem, dizendo que o governo em Beirute estava apenas a pedir um imediato cessar-fogo e que já não estava interessado num pacote político para ir com ele. Valerá a pena dizer que o Sr Jeffrey Feltman, cujo país fez a bomba que matou os inocentes de Qana, escolheu não comparecer.
Publicado no Independent a 31 Julho 2006